segunda-feira, junho 01, 2009

Gémeo Luís # Entrevista 4

Nos livros assina como Gémeo Luís mas parece-nos que esse não é o seu verdadeiro nome. Porque usa um pseudónimo?
Desde pequenino, desde a sementinha que o meu papá colocou na minha mãe que eu convivo com o meu irmão gémeo. Todos se referiam a nós como: Os gémeos, o gémeo Luís e o gémeo Rui... Achei que adoptando este pseudónimo estava também a entrar nesse mundo de fantasia, neste mundo de sermos o que queremos... de decidir por onde e onde vamos. Chamo-me Luís Mendonça e é assim que assino todas as minhas actividades (professor, designer, pai, namorado, editor, palestrante...) o de Gémeo Luís é só para a actividade pela qual ouviram falar de mim.

Onde nasceu e em que ano?
Tenho 44 anos. Vivi durante um ano, desde que nasci com os meus pais e os meus irmãos, dois mais velhos e o outro igual a mim... com um grupo de meninos de cor. Eram todos pretinhos e muito meiguinhos. Em Lourenço Marques... numa colónia portuguesa que os os portugueses ocuparam durante demasiados anos. Sabem a que país me refiro? E em que ano foi ? Foi no dia 13 de Março!

Onde vive?
Vivo numa cidade muito hospitaleira. Vivo na cidade onde tirei o meu curso, onde estudei. Vivo na cidade do Porto, vivi até aos 18 anos em Coimbra e depois de estudar decidi viver no Porto, onde conheci a minha namorada e onde fiz muitos amigos que gostam das mesmas coisas que eu, que se interessam e incomodam com os mesmos valores. Vivi durante 3 anos em Macau (outra cidade ocupada pelos portugueses durante mais de 400 anos mas que entretanto devolveram aos seus responsáveis). Gosto muito de viajar e de conhecer coisas diferentes... mas é no Porto que me vou sentindo em casa.

Quando tinha a nossa idade em que escola andou? Já gostava de desenhar?
Numa aldeia chamada Vila Pouca do Campo, a 10 km da cidade dos estudantes. Desde pequenino que gosto de desenhar. Desenhava para me divertir e para representar ou explicar coisas. Desenhava para brincar com os mais velhos ou para ocupar tempo. Para mostrar a minha habilidade ou porque me pediam. Hoje faço desenhos com motivos diferentes, para outras causas. Quando fui estudar para a Faculdade de Belas Artes pensava que tudo era como eu idealizava... mas fui mudando de opinião. Hoje uso o desenho com objectivos muito mais válidos e úteis.

Quando sentiu que queria ser ilustrador?
Eu não sou só ilustrador. Eu de vez em quando ilustro um tempo ou uma frase ou um livro. O meu primeiro livro foi feito em Macau, em 1996!

Qual foi o primeiro livro que ilustrou?
Embora tenha editado em Macau um livro ilustrado (Moinho de Tempo), uma compilação de ilustrações feitas para revistas, para jornais, para convites, para cartões, para cartazes... o meu primeiro livro ilustrado foi Grávida no Coração... um livro que fala de um menino que foi adoptado. Foi feito com uma educadora da escola/colégio das meus filhas.

Tem mais alguma actividade para além de ilustrador?
Sim, tenho muitas. Dou aulas na universidade do Porto, na Faculdade de Belas Artes, dou também aulas na Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos, sou Designer e dono de uma empresa que faz design gráfico para muitos clientes diferentes, como câmaras municipais, organismos culturais, empresas, individuos, faz cartazes, identidades, livros, rótulos, desdobráveis, publicidade, sites,... sou editor, tenho uma pequenina editora que faz livros (www.eterogemeas.com), sou pai de três meninos (duas meninas e um menino) e gosto muito de os acompanhar no seu dia a dia, tenho uma namorada (que é a mãe dos meus três filhos e aquela com que casei há 15 anos) que é arquitecta e que algumas vezes me convida para trabalhar com ela... faço muitas, muitas coisas diferentes.

O que acha que é necessário para alguém ser ilustrador?
Precisa de ler com muita atenção e de se sentir útil na história, precisa de ter uma coisa para contar, precisa de saber e ter consciência de que tem uma missão, que tem a responsabilidade de desenhar com mistério, fantasia, cultura, humos, prazer... de ter a consciência que está a contar uma história a um pequeno, ou a um grande ou aos dois ao mesmo tempo e que o está a fazer com outra pessoa, com o escritor que o está fazer também, com o designer e com o editor.

Tem algum animal preferido?
Tenho muitos, depende do momento e da disponibilidade. Em casa só tenho peixes (num tanque no jardim). Porque nunca sei onde vou estar e quanto tempo estou fora e não quero que dependam de mim ou da família e depois se sintam abandonados. Dou carinho a cães e gatos, a cavalos e macacos de amigos e familiares... Vivo com vários mas nunca os vou ter por capricho.

Nós somos alunos do 1º ciclo. Tem alguma memória que nos queira contar de quando era aluno como nós?
Que eu e o meu irmão gémeo éramos muito traquinas, muito vivaços, muito intensos e que na altura achava (porque todos mo referiam) que ia ser difícil ser um homem respeitado, mas hoje sei que foi muito bom terem tido paciência e ternura pelo meu feitio.

Qual era a sua brincadeira preferida?
Jogar futebol, apanhar e comer fruta dos quintais da casa e dos familiares e de outros de quem não sabia serem os donos,... adorava andar de bicicleta, adorava desmontá-las e voltar a amontar todas as pecinhas...

Onde é que gosta de trabalhar?
Em casa, no atelier, na escola, com amigos (grandes e pequenos)

Tem alguma cor preferida?
Não. Tenho muitas. Depende se é para vestir se é para desenhar, se é para um objecto, um edifício ou uma festa...

Quando tem de fazer um trabalho de ilustração onde se inspira?
Nas coisas mais simples, nas emoções, nas pessoas, nos vizinhos, na Música, na Arquitectura, na História...

Que técnicas utilizou para ilustrar o livro " A Saquinha da Flor"? E o livro "O Aquário"?
O desenho e a escrita no inicio. Faço desenhos e escrevo adjectivos, sensações, cenários... depois recorro a uma técnica que me parece adequada. Na "Saquinha" recorri ao recorte de papel com tesoura e x-acto. N` O Aquário recorri ao acrílico com pincéis.

Porque que é que algumas das suas ilustrações parecem sombras?
Talvez porque são recortes em papel e tu faças a antecipação a esse imaginário, alguns desenhos recorrem à soma de forma e fundo e daí essa sensação.

Já fez ilustrações para o estrangeiro?
Já! faço muitas vezes. Na semana passada ganhei um concurso em Itália, com um novo livro: "Berlinde". Também ganhei prémios em Espanha e noutros países. Fiz também há pouco tempo uns desenhos para a Argentina.

Qual vai ser o seu próximo trabalho? Pode contar-nos alguma coisa sobre ele?
Tenho vários trabalhos começados. Para livros, escultura, cartazes, campanhas, sinaléctica, logótipos. A minha vida é muito, muito ocupada e divertida.

Quando tinha a nossa idade qual era o seu livro preferido?
Não me lembro.

Tem medo de fantasmas?
Tenho! Dos fantasmas que nós e os nossos criam. Os outros não me assustam.

Tem os pés grandes?
Tenho muito, muito grandes... quando dou por mim já estou muito, muito longe. Não sei se é dos pés ou das pernas ou da cabeça.

Gosta de doces?
Gosto muito de mimos, gosto de dar e receber. Mas gosto muito mais de os dar. Gosto até de os dar sem os outros saberem.

Alguma vez apanhou com a colher de pau?
As suficientes, nem demasiadas porque não perdi a vergonha, porque não fiquei com medo nem de pessoas nem de sítios, porque não fiquei com medo de perguntar ou de experimentar, porque sinto-me livre e com auto-estima suficiente mas também não apanhei poucas vezes. Quando me portei mal ou quando não respeitei os mais velhos e sábios ou quando magoei os mais fracos ou frágeis, ou quando fui injusto... o meu pai ou a minha mãe ou avó... ou um ou outro professor deu-me uma "colherada" rápida e oportuna... Acho que me fez pensar e melhorar uma ou outra coisa.

Gosta de música? Canta no duche?
Gosto muito muito de música, de vários géneros: clássica, popular, interventiva... complexa ou , gosto muito de música experimental... gosto tanto de tantos géneros que até gosto de ouvir os pingos de água a bater na nuca ou na cara, nos ombros ou no peito.... gosto de ouvir a água a bater na banheira ou na água que está ao pé dos pés.... o vapor da água ajuda a saborear os sons... e até a viajar.

Se tivesse que desenhar a nossa escola como é que o faria? E o nosso amigo, o João Marques?

Só desenhava a tua escola se o tivesse que fazer. Depois só a desenhava se soubesse como a queria contar... se era uma escola fixe, se gostava de nadar lá ou se não gostava, se era horrível. Precisava decidir se falava com desenho de uma parte ou de toda a escola, precisava de saber se queria que ela fosse lia (vista) como uma escola alegre ou triste, se era um sítio bom ou mau... se as pessoas que lá habitam são divertidas ou tristes, se gostam de lá andar ou não, se...
Para o vosso amigo já era a mesma vista... ele há-de ter uma característica melhor que outra, ele hã-de ter uma parte mais específica que outra, ele há-de ter um determinado feitio, primeiro precisava saber o que quero os outros saibam dele...

Até breve. Um abraço, um beijo, um beliscão. Luís.


Gémeo Luís é pseudónimo de Luís Mendonça, designer e docente na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e na ESAD - Escola Superior de Arte e Design de Matosinhos.
O seu livro “A palavra que Voa” foi nomeado para a lista de Honra do IBBY (International Board on Books for Young People) 2006.
Obteve o Prémio Nacional de Ilustração 2005, do IPLB com o livro “O Quê Que Quem - Notas de Rodapé e de Corrimão” , tendo obtido, em anos anteriores, Menção Especial do Júri respectivamente com os livros “Grávida no Coração” e “O g É um Gato Enroscado”.
Ilustrou, em mais de uma vintena de livros de diversos escritores, entre outros, Alice Vieira, João Pedro Mésseder, Álvaro Magalhães, Ana Saldanha, Vergílio Alberto Vieira, Francisco Duarte Mangas, José Viale Moutinho, Eugénio Roda, Paula Pinto da Silva, José-Alberto Marques, Luís Adriano Carlos, Ilda Taborda, Matilde Rosa Araújo, em edições da Editorial Caminho, Campo das Letras, Deriva Editores, Primeiros Passos, Gailivro, Revista Macau, Revista OP, Revista UPORTO, Edicões Éterogémeas. Fonte: O Regional
http://www.gemeoluis.com/

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